Oiê, boa leitura! ✨
Antes de começar, devo dizer que vivi um furacão desde a última vez que escrevi por aqui. Não à toa, vim falar de um assunto que eu amo e tem grande importância na minha vida: o processo terapêutico e o quanto ele, antes de ser bom, pode ser horrível!
Bem, você já deve ter ouvido falar do quanto é importante fazer terapia, o quanto todo mundo deveria fazer e blá, blá, blá. Aqui, eu quero olhar por outra perspectiva, uma mais honesta e realista.
No final desse texto, vou deixar opções de atendimento para pessoas que não têm condições financeiras para investir ou que precisam de atendimento com valores sociais. Afinal, sei que a terapia ainda é um privilégio de poucos, infelizmente.
Vamos lá! Pegue uma bebida e acomode-se confortavelmente. Espero que esse texto seja útil ou que, ao menos, te faça refletir sobre a sua vida.
É bem fácil entender porque a maioria das pessoas passa a vida inteira sem se dedicar verdadeiramente ao autoconhecimento. E aqui não tô falando de skincare, leitura, atividade física e etc, mas falo sobre olhar pra dentro e o quanto, quase sempre, isso é tão difícil e desconfortável. É infinitamente mais fácil só seguir a vida como se tudo fosse responsabilidade do outro e “eu sou assim mesmo".
Na terapia, que normalmente começa por um motivo específico, a gente vai descobrindo que a gente também é um porre, que também somos vilões na vida de outras pessoas. Muitas vezes na nossa, inclusive. Já parou pra pensar em quantas vezes você foi horrível com você mesmo? É o que chamamos de autossabotagem. Se nunca pensou sobre isso, deveria pensar, porque viver exige presença e autorresponsabildiade.
É um pouco sobre isso, né? Ser um adulto funcional, independente, maduro emocionalmente a ponto de assumir “fui babaca", “agi por impulso”, “não tô pronto pra isso agora” ou “me desculpa” é bem complexo, exige coragem, mas é muito necessário.

Uma vontade de ser ignorante pra sempre
Outro dia, pós sessão, eu pensei “e se eu desistir da terapia?”. Até falei disso com a Lu, minha terapeuta, que, inclusive, merece muitos créditos pelo meu processo e já está comigo há quatro anos nessa jornada.
Levei esse questionamento também pra uma thread e uma pessoa respondeu com algo que me deixou reflexiva. Ela disse: “não desiste, esse é o momento em que você está chegando onde deveria". E isso fez muito sentido pra mim naquele momento. Porque eu entendi: quanto mais dói, mais perto você está de encontrar a ferida.
A terapia não vai te trazer respostas, muitas vezes ela vai trazer questionamentos que você nem sabia que poderiam existir. Ela também não é sobre mudar quem você é ou alcançar quem você quer ser, isso tudo é consequência. Acho que é mais sobre voltar para si e descobrir as ferramentas internas para elaborar questões que você antes não conseguia, por não conhecer.
E algo que eu aprendi nesse tempo e faz toda a diferença: é preciso estar entregue, disposto e verdadeiramente interessado em tomar consciência de si mesmo. Senão, vai ser só mais um lugar pra reclamar da vida, sem nenhuma mudança de comportamento. Ser o seu maior objeto de estudo, saber tanto sobre você a ponto de não permitir que ninguém te faça duvidar de si mesmo. Também é um pouco sobre isso!
Por exemplo, você tem dificuldade de dizer “não", saiba que a análise não vai te ensinar a dizer “não". Muito provavelmente ela vai te guiar no caminho de descoberta do porquê você não consegue e, a partir disso, você pode refletir e, talvez, caminhar em busca das diversas formas de dizer “não" de forma consciente. E pra isso, você precisa, antes de tudo, estar disposto a conhecer partes suas que podem ser horríveis.
No processo de luto, para trazer outro exemplo, a terapia não vai curar você, mas vai te guiar e te ajudar a entender que quando o outro vai embora, você não precisa perder o chão. É possível encontrar uma forma de seguir, mesmo quando tudo parece desabar. Isso porque a maturidade emocional não te faz deixar de sentir ou evitar sentir, mas ela te faz agir independentemente do sentimento.
Qual é a sua responsabilidade na bagunça da qual você se queixa?
É preciso lembrar também que, sim, muito do que a gente vive na vida adulta é uma repetição de situações que vivemos na nossa infância, o que muitas vezes chamamos de padrão. E aqui peço uma “licença poética” (ou seria uma licença psicanalítica?) pra trazer um termo teórico, mas que eu aprendi na terapia e estudando esse tema: segundo Freud, “a fantasia inconsciente assume um papel central na origem do trauma e da neurose, e a realidade psíquica é reconhecida como um campo de força com poder de afetar profundamente o indivíduo, independentemente da ocorrência real de um evento externo.” Ou seja, para a criança, não importa se algo aconteceu ou não, a emoção vivenciada e o sentimento desenvolvido em seguida já podem gerar um trauma.
É claro que a forma como cada pessoa vai ser afetada, muitas vezes tendo vivido a mesma situação, vai depender de muitos fatores individuais. Como no caso de dois irmãos, por exemplo, que vivem a mesma infância, mas acabam por desenvolverem padrões diferentes na vida adulta.
Em uma ideia, que entendo como complementar, Otto Rank - um psicanalista austríaco e colega de Freud - em sua obra "O Trauma do Nascimento", de (1924)”, argumenta que “o nascimento é o protótipo de todo trauma subsequente na vida de um indivíduo.” Ou seja, nascer já é um evento traumático e a partir daí, é aquele meme: daqui pra frente é só pra trás rs!
Se ainda não ficou claro pra você, vou ser bem didática agora: se você não buscar se conhecer, se acolher e se autorresponsabilizar (não disse culpar, ok?) pelas suas ações, vai passar a vida buscando alguém para culpar (aqui, é culpar mesmo).
E, caso você queira ter filhos, diria que eles podem ser os mais impactados da sua terapia, ou da falta dela. Porque aquilo que a gente não transforma em nós, a gente repete pra sempre (o famoso: padrão).
Tem uma frase da Clarice que eu gosto muito e toca esse tema. Ela diz:
“A infância é um chão que a gente pisa a vida inteira.”
O que muda tudo
Longe de mim querer generalizar o que a terapia é ou não. Falo de um lugar de aprendizado contínuo, baseado no meu conhecimento empírico - não teórico - sobre o tema. Mas trago uma analogia que sempre uso para descrever como tem sido pra mim, desde que comecei o processo terapêutico, há oito anos.
Imagine que você está em um quarto escuro, não consegue enxergar nada, nem onde pisa, o que faz ou como se sente sobre o que acontece nesse quarto. Esse é o seu inconsciente, digirindo a sua vida. Você não é o piloto, é o passageiro.
De repente, o momento que muda tudo: você acende a luz. Isso é a terapia. Agora você consegue ver o que acontece no quarto. Você chuta a cama com o dedinho, esquece a janela aberta e o vento bagunça tudo, chega a hora de dormir e a cama tá uma zona, tem poeira no chão, teia de aranha pelo teto e papel espalhado por todos os lados.
Acender a luz não quer dizer resolver os problemas que já existiam no escuro. Mas sim, ser capaz de ver eles acontecendo. Antes, era tudo no automático, você não via. No momento em que você vê o que faz, isso não significa que você vai deixar de fazer. Esse é o momento seguinte da terapia. Entre conhecer o que se faz e transformar isso, existe uma longa jornada.
Mas, a cada dia, você se torna mais capaz de dizer “não" quando quer dizer “não" e de agir com a razão, mesmo quando o seu sentimento grita dentro do peito!
É como dizia Carl Yang - psiquiatra e psicoterapeuta suíço, fundador da psicologia analítica:
"Até você se tornar consciente, o inconsciente irá dirigir sua vida e você vai chamá-lo de destino.”

É preciso coragem
Dito tudo isso, não vim aqui para te fazer desistir da terapia, mas para refletir enquanto escrevo: faz sentido viver no automático? Faz sentido viver com base no medo? Como disse a Lu: “Você pode parar a terapia, mas isso não significa que a dor vai parar. Só vai doer de um jeito diferente.” A gente pode escolher: a dor de uma vida inteira sem olhar pra si ou a dor e a delícia de ser o que é, como disse Caetano Veloso. Porque, muitas vezes, somos e desejamos coisas que não conseguimos assumir por medo.
A psicanalista Fernanda Samico, da Casa do Saber disse em um post recente no Instagram: “Análise não é nem sobre o que eu quero dizer, nem sobre o que eu digo, é sobre aquilo que eu eu digo sem querer e descubro que era o que eu precisava falar.”
Também deixo a recomendação da minha maior diva da psicanálise: Ana Suy, apenas perfeita com o total de 0 defeitos, autora do best-seller A gente mira no amor e certa na solidão. Não leu ainda? Pare tudo que está fazendo agora e vá ler, eu garanto que você não vai se arrepender!
Outro dia assisti a um vídeo em que uma mulher dizia: “no final, a gente morre. Ah, mas e se…?, no final a gente morre.” E, sabe, faz tanto sentido, porque crescer dói mesmo, não romantizando o sofrimento, mas não posso ser hipócrita de negar que a dor ensina, sim. E a vida não é curta, como dizem. Ela é mais do que suficiente, se você for capaz de encontrar beleza nas pequenas coisas e razão pela qual acordar todos os dias e querer ser alguém melhor, pra você mesmo. Porque no final também é sobre isso, ser melhor para si, consequentemente, te torna melhor para o mundo e para as pessoas, especialmente as que você ama. E convenhamos, o mundo anda precisando muito disso!
Como dizia Clarice:
“Depois do medo vem o mundo."
Então, se puder, tenha coragem de fazer terapia e não fugir de quem você é, por pior que você possa descobrir-se. No fim, sempre vai valer a pena!
Atendimentos sociais e/ou gratuitos
Centro de Estudos psicanalíticos (CEP): fazem triagem e atendem por valores sociais, perto da sua região. Foi onde comecei a minha jornada na terapia.
Centro de Psicologia Aplicada (CPA) da UNIP: atende gratuitamente qualquer pessoas que precisar. Os atendimentos são feitos por estudantes dos ciclos finais do curso de psicologia em várias regiões de São Paulo e alguns outros estados. Precisa agendar com antecedência.
Centro Escola do Instituto de Psicologia da USP (CEIP): são atnedimentos públicos, gratuitos e oferecidos à comunidade USP e ao público geral residentes no entorno da universidade, campus Butantã.
Psymeet: terapia online com psicólogos formados e que oferece mais de 3 milhões de atendimentos ao ano. É possível negociar o valor, dia e horário diretamente com o profissional escolhido.
Com afeto,
Ka
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